Exportadores brasileiros veem dificuldades nas relações comerciais com os Estados Unidos qualquer que seja o resultado das eleições finalizadas ontem. A avaliação é que, se por um lado o democrata Joe Biden pode trazer maior previsibilidade na balança comercial entre os dois países, por outro sua vitória deve ampliar pressões ambientais, dificultando acordos de livre comércio.
As eleições americanas vêm no momento em que o déficit comercial do Brasil com os EUA se amplia, diante de restrições a exportações impostas por Donald Trump nos últimos anos e de efeitos da pandemia, que derrubaram a venda de máquinas e equipamentos e o preço do petróleo, um dos principais produtos vendidos pelo Brasil àquele país.
Entre janeiro e setembro, o déficit comercial entre os dois países foi de US$ 3,12 bilhões (cerca de R$ 18 bilhões, na cotação atual), quase oito vezes mais que o de igual período de 2019. As exportações caíram 31,2%, enquanto as importações recuaram 22,9%.
Parte da retração se deve à queda do preço do petróleo, que derrubou o valor das exportações de óleo bruto e de combustíveis em 63% e 58,7%, respectivamente. Outra parte da queda se deve à pandemia, que cortou a menos da metade as vendas de aeronaves e motores não elétricos.
Mas uma parcela do déficit nos anos recentes é fruto de medidas protecionistas adotadas pelo governo Trump em meio à guerra comercial com a China, que afetaram principalmente as indústrias siderúrgicas e de alumínio a partir de 2018 e foram ampliadas sem aviso no último mês.
A imprevisibilidade da política comercial de Trump é vista por exportadores como uma das preocupações em relação à sua reeleição. Sem aviso prévio, os Estados Unidos anunciaram sobretaxas para o alumínio e reduziram as cotas de importação de aço.
Para os produtores brasileiros de alumínio, é uma estratégia de “chutar a porta e só depois começar a conversar”. “O que não temos hoje é previsibilidade”, afirma o presidente da Abal (Associação Brasileira do Alumínio), Milton Rego.
Em relação a Biden, a maior preocupação está na agenda ambiental. O candidato democrata já ameaçou “reunir o mundo” para pressionar pela preservação da Amazônia e condicionou a assinatura de acordos comerciais à adoção de medidas pelo governo brasileiro.
“Biden vai se dedicar mais ao aspecto de meio ambiente, tema que não é muito agradável para o Brasil”, destaca o presidente da AEB (Associação de Comércio Exterior do Brasil), José Augusto de Castro. “Mas com Biden é mais fácil conversar. Teoricamente, tem previsibilidade, enquanto ações as de Trump são tomadas de supetão.”
Castro diz, porém, não esperar mudanças drásticas nas relações comerciais no curto prazo, já que o mercado se move neste momento ao sabor da pandemia. Com a redução da demanda, há excedentes na oferta global de produtos manufaturados, que dominam a pauta de exportação brasileira para os Estados Unidos, o que deve aprofundar a competição pelos importadores.
O setor de máquinas e equipamentos concorda. “Se ganhar Trump ou Biden, as vendas não vão se alterar. O problema dos EUA agora é a Covid-19”, avisa o presidente-executivo da Abimaq (Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos), José Velloso.
China lidera como destino das exportações do País
A queda nas importações acompanhada da estabilidade nas exportações fez a balança comercial registrar o segundo maior superávit para meses de outubro. No mês passado, o Brasil exportou US$ 5,473 bilhões a mais do que importou, divulgou ontem o Ministério da Economia.
O resultado só perde para outubro de 2018, quando a balança comercial tinha registrado superávit de US$ 5,792 bilhões. No mês passado, o País vendeu US$ 17,855 bilhões para o exterior, com leve alta de 0,3% pelo critério da média diária em relação ao mesmo mês do ano passado. As importações, no entanto, caíram, somando US$ 12,383 bilhões, redução de 20% também pela média diária.
O subsecretário de Inteligência e Estatísticas de Comércio Exterior do Ministério da Economia, Herlon Brandão, destacou que, mesmo com queda em outubro, a China ainda é o principal destino das exportações brasileiras, chegando a 48,3% do total de vendas para o exterior de janeiro até o mês passado. No mesmo período do ano passado, a fatia chinesa era de 40,9%.
“A China (inclui Hong Kong e Macau) continua sendo o principal destino das exportações, com alta de 10,2% no ano até outubro. Já as exportações para os Estados Unidos caem 29,6% no ano, mas queda já foi menor em outubro, de cerca de 15%”, acrescentou Brandão.
A participação dos EUA como destino dos produtos brasileiros caiu de 13,1% em 2019 para 9,8% de janeiro a outubro deste ano. No mesmo período, também houve queda de 18,2% nas vendas para Argentina, cuja participação caiu de 4,4% para 3,9% do total.
No acumulado de 2020, as exportações somam US$ 174,379 bilhões, retração de 6,5% na comparação com o mesmo período de 2019 pela média diária. As importações totalizam US$ 126,717 bilhões, recuo de 14,7% pelo mesmo critério.
A maior parte da alta do saldo em outubro é explicada pela queda da importação da indústria de transformação, que recuou US$ 140,67 milhões pela média diária em relação ao mesmo mês do ano passado, e da indústria extrativa, cujas compras do exterior encolheram US$ 15,16 milhões.
Do lado das exportações, o fim da safra de grãos fez as exportações da agropecuária caírem US$ 36,93 milhões pela média diária em relação a outubro do ano passado. Em contrapartida, as vendas da indústria extrativa subiram US$ 14,89 milhões, e as exportações da indústria de transformação, que acumulavam uma longa sequência de quedas, subiram US$ 23,38 milhões na mesma comparação.
Fonte: Jornal do Comércio